terça-feira, 13 de novembro de 2012

Aids depois dos 50


Mulheres são as principais vítimas nessa faixa etária

A aids sempre foi vista como uma doença de adultos e jovens. O senso comum criou a falsa noção de que o segmento populacional acima dos 50 anos de idade estaria distante de riscos e vulnerabilidades em relação à infecção pelo HIV. A evolução da epidemia, no entanto, tem mostrado o aumento do número de casos novos em pessoas a partir dessa faixa etária, representando 2,3% do total de casos notificados de aids no Brasil, em 2007. Além disso, é importante lembrar que não há mais grupos de risco, mas sim, situações de risco acrescido, e que todos, com práticas de sexo desprotegido, encontram-se expostos à infecção por HIV e outras DST.

Os dados, se analisados em conjunto com o envelhecimento da população brasileira e o aumento da sobrevida de pacientes vivendo com aids, demonstram que teremos, em curto espaço de tempo, um incremento relevante no número de pessoas soropositivas vivendo na terceira idade. Além disso, o surgimento de medicamentos para disfunção erétil possivelmente contribuiu para que essa população mantivesse vida sexual ativa, favorecendo a exposição à infecção pelas DST e HIV.

Os tabus que cercaram a vivência da sexualidade das pessoas acima dos 50 anos limitam e dificultam a abordagem no campo da prevenção. Entre eles está a ideia preconcebida sobre com quem se deve ou não usar o preservativo. Isso contribuiu para a vulnerabilidade do grupo de pessoas que viveu a maior fase da vida sexual em um período em que camisinha era utilizada apenas para evitar gravidez indesejada.

Os profissionais de saúde podem ajudar a desconstruir o estereótipo de que pessoas acima dos 50 não têm vida sexual ativa. Os médicos devem aproveitar a confiança depositada pelo segmento na categoria para despertar nessa faixa etária a testagem para HIV. A não solicitação do exame pode adiar a descoberta do vírus na velhice, proporcionando a evolução da infecção com progressão da doença, acarretando em prejuízo imunológico e clínico.

O cenário atual da transmissão de DST e aids entre os cinquentões e mais velhos demanda atenção das categorias médicas. Até 2006, o diagnóstico de aids no Brasil em pessoas nessa faixa etária foi de 9.918 casos, sendo 6.728 em homens e 3.190 em mulheres. Atualmente, existem 48.064 pessoas vivendo com aids acima dos 50 anos, diagnosticadas e em uso de terapia anti-retroviral (com avanço no déficit imunológico indicativo de início de tratamento específico).

Em pesquisa recente (amostra de 510 participantes na faixa etária média de 69 anos), cerca de 22% apresentavam parceiro fixo e 55,3% não possuíam companheiro fixo 105 (20,6%) dos participantes julgavam a aids como castigo divino relacionado aos que cometeram pecados, 158 (31%) conheciam alguma pessoa vivendo com HIV 440 (86,3%) do total referiram não ter por hábito o uso de preservativo, sendo que 56 (11%) já tinham realizado testagem anti-HIV em algum momento de suas vidas.

É importante considerar a vulnerabilidade feminina, nessa faixa etária, que tem dificuldade de negociar o uso do preservativo, durante as relações sexuais com parceiros fixos ou não. Muitas vezes, a vulnerabilidade à infecção pelo HIV parte de relacionamentos com duração de décadas, mantidos sem diálogo entre o casal.

Estima-se que, nos próximos 20 anos, a população de idosos, no Brasil, ultrapasse os 30 milhões, alcançando 13% da população geral. Em dez anos, o contingente de pessoas com 60 anos ou mais aumentou 35,5% no país verificou-se um acréscimo de 10,7 milhões para 14,5 milhões.
Portanto, essa discussão espelha um alerta para a relevância de trabalhos em saúde pública direcionados a essa parcela da população, objetivando informações validadas, no intuito de esclarecer dúvidas pertinentes e o grau de vulnerabilidade de quem tem mais de 50 anos de idade frente à epidemia.

É necessário promover conscientização, com mudança de comportamento. Essa geração precisa se prevenir da infecção por HIV e outras DST e aprender que aids é uma doença que tem tratamento, mas ainda sem cura. É preciso também derrubar tabus e preconceitos sociais, com a ideia de que as pessoas são as culpadas pela própria situação de enfermidade. Nessa atitude preventiva, os profissionais de saúde têm papel fundamental.

Os profissionais de saúde, em especial os médicos, podem e devem abranger o tema em uma abordagem multidisciplinar, voltadas para o exercício da sexualidade saudável e em ambiente de confiança. O público acima dos 50 precisa se reconhecer como parte do processo, como iguais nas perspectivas apresentadas pela aids nesse segmento.



Mariângela Simão é diretora do Programa Nacional de DST e Aids do Ministério da Saúde. José Telles é coordenador da Área Técnica de Saúde do Idoso do Ministério da Saúde.

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