“É,
está difícil para você.” Foi o que Ana Lúcia Azevedo escutou de sua chefe ao
dizer que deixaria o trabalho para cuidar da mãe, uma idosa de 85 anos com
demência.
Com
a nova lei dos domésticos, o custo do serviço de cuidador ultrapassará o
salário de Ana, 47, que é auxiliar administrativa. “Pagamos R$ 1.000 para a
cuidadora da minha mãe. Eu ganho R$ 1.200″.
A
lei, que estipula jornada de oito horas diárias e 44 semanais, estabelece o
pagamento de horas extras (no máximo duas por dia) e adicional noturno (que
ainda depende de regulamentação).
Para
estar dentro da lei, Ana teria de contratar no mínimo mais dois empregados. Sua
mãe, Maria Olinda, precisa de atenção 24 horas. O custo é alto demais para
elas.
Relatos
como o de Ana são cada vez mais comuns, diz o presidente da Associação dos
Cuidadores de Idosos de Minas Gerais, Jorge Roberto Souza. “É positivo que os
familiares se envolvam mais no cuidado do idoso, mas isso não pode
significar abrir mão da própria vida.”
Souza
estima que haja cerca de 200 mil cuidadores de idosos no país. Ele é favorável
aos direitos dos profissionais, mas acredita que deve haver algum tipo de
compensação para as famílias.
“Esse
serviço é uma necessidade. Não podemos onerar ainda mais os parentes.
É
dever do Estado atender o idoso, então que assuma parte desses encargos”, diz. O
presidente sugere um abatimento no Imposto de Renda ou isenção do INSS para
famílias com cuidadores.
CUSTO
De
acordo com estimativa de Souza, o serviço deve encarecer no mínimo 40% -há
casos em que esse custo mais do que dobrou. Pesquisa do Datafolha indica que o
salário médio de um acompanhante de idoso para dormir no serviço é R$ 1.826. Segundo
Souza, parentes devem recorrer mais a instituições.
A presidente da associação de cuidadores de idosos de São Paulo, Lídia Nadir, diz que não há vagas suficientes nas instituições. “As famílias podem querer institucionalizar, mas não vão conseguir.”
Para
Souza e Nadir, a nova lei não considerou as particularidades do trabalho do
cuidador. “As famílias estão desesperadas”, diz Souza.
Ana
Lúcia não tem conseguido dormir com a perspectiva de deixar o emprego para
viver com a mãe. “Fiz isso por dois anos e quase enlouqueci, não tinha vida.”
No
início, Maria Olinda tinha delírios e crises, intercaladas por momentos de
consciência em que lamentava: “Não quero incomodar”.
A
filha não compreendia a doença e perdia a paciência: “Ainda me arrependo de
coisas que disse”.
Hoje,
Maria Olinda está melhor, mas não pode ficar desacompanhada.
Décadas
atrás, foi ela quem prestou auxílio na casa de outras pessoas. Trabalhou como
faxineira por mais de dez anos. Para Ana, empregada doméstica é um luxo: “Nunca
tivemos uma, mas não podemos viver sem cuidador”.
Via Folha de SP
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